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Para Figueiredo, BC sinaliza que pode elevar juros em abril

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15/02/2013 - 09:20

O Banco Central (BC) deve iniciar, em abril, um novo ciclo de aperto monetário. A sinalização, segundo Luiz Fernando Figueiredo, sócio da Mauá Sekular Investimentos, foi dada pelo presidente do BC, Alexandre Tombini. Na semana passada, Tombini disse que não está confortável com a inflação e com o fato de os reajustes de preços terem se espalhado pela economia. "O BC veio a público e falou, com todas as letras, que muito provavelmente vai subir a taxa de juros. Fora de um documento formal e de uma reunião do Copom, não sei o que mais ele poderia ter falado para dizer isso", afirmou Figueiredo em entrevista ao Valor. "No mercado, a ficha ainda não caiu."

Ex-diretor do BC, Figueiredo acredita que, depois da intervenção do BC no mercado na última sexta-feira, com a intenção de diminuir um pouco a queda do dólar, ficou claro que o câmbio não será usado como substituto dos juros no combate à inflação.

Ele diz que, quanto mais cedo o BC agir, menor será o aperto monetário necessário para derrubar a inflação e melhorar as expectativas.

Valor: O governo adotou medidas para reduzir custos de produção, baixou o juro e desvalorizou o câmbio. Por que a economia não cresceu?

Luiz Fernando Figueiredo: O segundo semestre do ano passado foi muito confuso. Apesar de reconhecermos que as intenções do governo foram na direção correta, os agentes econômicos tiveram a sensação de um intervencionismo que suplantou as boas intenções. A comunicação atrapalhou muito, informou pouco e criou a ideia de ativismo excessivo que, no fim, gerou a percepção de que o governo estava em pânico e de que poderia fazer qualquer coisa. Provavelmente, se tivesse feito de uma maneira diferente, com mais tranquilidade, teria tido um resultado diferente.

Valor: Um exemplo.

Figueiredo: Em 2012, o governo fez um superávit primário em torno de 2% do PIB. Não fez mais porque, basicamente, promoveu desonerações. Desoneração é algo muito bom porque significa reduzir o custo do Estado na economia, o custo das empresas nas suas atividades, o que faz sobrar mais dinheiro para investir e gerar lucros. O problema de competitividade da economia está sendo atacado. Se tivesse dito no início do ano passado que iria fazer um superávit primário ao redor de 2% do PIB e que essa diferença em relação a 3,1% seria por causa das desonerações, o governo teria sido aclamado. No fim, foi isso o que governo fez, só que ele disse até o último dia do ano que chegaria a 3,1%, sem nenhum desconto. Não conseguiu, como todo o mundo já sabia, e acabou apelando à criatividade contábil para cumprir o que estava no orçamento. Apesar de toda essa confusão, o governo estava tentando ajudar o lado da economia que precisa ser ajudado. Trouxe dinheiro de longo prazo, dinheiro barato, fez desonerações, deu um câmbio favorável, bem como atacou o problema da infraestrutura via concessões. Esse conjunto de coisas, sem dúvida, vai na direção de ampliar a oferta de bens na economia. Nos últimos dez anos, funcionamos assim: a nossa economia tem um motor muito grande vindo do consumo, da demanda, e depois é que vem a oferta. Esse é um processo que acaba vindo com maior pressão inflacionária.

Valor: Por quê?

Figueiredo: Porque primeiro eu tenho gente querendo comprar e não tenho oferta de produtos e só depois gero essa oferta. É um processo que acaba provocando inércia e uma pressão sobre os preços. Criou-se um desequilíbrio: tivemos demanda e o setor de serviços fortes e uma indústria e investimentos muito fracos. O que está ocorrendo agora é que a economia está se reequilibrando.

Valor: Como?

Figueiredo: Do lado da demanda, as pessoas já estão com um comprometimento de renda importante, tanto no crédito quanto para gastar mais em serviços. Portanto, esse grande motor do crescimento já não está tão disponível. Esse é um sinal de evolução porque antes não tínhamos crédito e agora passamos a ter; não tínhamos consumo de serviços, hoje temos.

Valor: O que deve ser feito para o PIB crescer de agora em diante?

Figueiredo: Temos que contar mais com o motor do investimento, da indústria etc. Se isso vier, teremos um crescimento mais balanceado, com menor pressão sobre a inflação. O desafio é conquistar isso. O governo adotou uma série de medidas nessa direção, mas acabou gerando uma enorme confusão.

Valor: O governo fez o diagnóstico correto?

Figueiredo: Sim e fez uma série de coisas corretas. Por exemplo: as concessões. Quando é que a gente viu no Brasil concessões para rodovias, ferrovias e aeroportos? Nunca. Só lá na época do Fernando Henrique Cardoso e parou por ali. A maneira como isso estava sendo feito agora foi dura, como a limitação da taxa de retorno das empresas e a adoção de regras muito rígidas. Recentemente, o governo reviu essa postura.

Valor: De que forma?

Figueiredo: Flexibilizando as regras. Provavelmente, vamos ter o processo de concessões acontecendo, o que é muito importante. Não só porque vai trazer investimentos, embora mais no ano que vem do que neste, mas também porque é uma sinalização forte para o outro lado da economia. As empresas brasileiras fizeram um trabalho enorme dentro de casa para melhorar a competitividade, mas elas não têm como melhorar da porta para fora. O produto pronto até chegar ao cliente no Brasil paga um dos maiores custos do mundo. Pela primeira vez, isso está sendo enfrentado. O problema é que, da maneira como isso estava sendo posto, não ia acontecer.

Valor: O problema não persiste?

Figueiredo: A percepção é muitíssimo pior que a realidade. O problema é que é a percepção que gera confiança e investimento. Se você estiver com uma percepção ruim durante muito tempo, a realidade acaba se tornando a percepção, e não o contrário. Estou convencido de que o governo viu que se atrapalhou e está, neste momento, fazendo o que chamo de uma 'parada de arrumação'. O governo aprendeu, tem muita água para rolar, mas há sinais inequívocos.

Valor: Quais são esses sinais?

Figueiredo: O primeiro é um maior realismo com as perspectivas de crescimento da economia. O segundo é que o governo está dando um tratamento mais realista à política fiscal. Em vez de falar que vai fazer 3,1% do PIB de superávit primário até o fim do ano, está dizendo que fará menos, já deu até o valor [R$ 65 bilhões]. E está informando que a diferença entre o que pretende fazer e a meta é desoneração. Outro ponto é a flexibilização das regras de concessão.

"O governo errou principalmente no discurso de que o câmbio deveria ser de R$ 2,00 ou mais. Isso acaba ampliando o 'pass through"

Valor: Quais são os outros sinais?

Figueiredo: O fato de a presidente Dilma ter recebido representantes da iniciativa privada. Esse diálogo é super importante e a presidente fez ela mesma. O próprio 'road show' no exterior, para explicar a modelagem nova das concessões, com parâmetros muito mais interessantes para cada um dos setores. Um outro ponto importante foi ter deixado o câmbio flutuar mais.

Valor: Por quê?

Figueiredo: Havia duas visões: a de que a taxa de câmbio não cairia abaixo de R$ 2,00 de jeito nenhum e de que existia uma certa banda. Além disso, chegou a se pensar que o câmbio podia ir a R$ 2,20, R$ 2,30, e por aí vai. Na prática, o que o BC fez foi deixar flutuar. O câmbio passou dos R$ 2,10 como também caiu abaixo de R$ 2,00. Não é intenção do governo deixar o câmbio apreciar muito. Não acredito que o BC vá utilizar o câmbio como instrumento de combate à inflação. Se eles desvalorizaram o câmbio no ano passado e sofreram o impacto disso na inflação, fazer o contrário agora não faria sentido, atrapalharia inclusive o objetivo deles que é gerar mais investimentos. O câmbio oscilar mais e ficar menos sob pressão, como ocorreu no fim do ano, acaba ajudando [a conter a inflação]. Um câmbio estável e menos volátil auxilia muito o investimento. Já ouvi de exportadores que é melhor ter um câmbio mais apreciado, mas estável, do que um câmbio muito volátil, que diminui a previsibilidade. Em 2012 houve vários choques de preços, mas, se pegarmos só o da taxa de câmbio, veremos que, de setembro de 2011 até fim do ano passado, ele gerou mais ou menos 1,2 ponto percentual de inflação.

Valor: Quando o senhor diz que a flutuação do câmbio mostra que o governo aprendeu, significa que ele errou antes?

Figueiredo: O governo errou principalmente no discurso de que o câmbio deveria ser de R$ 2,00 ou mais. Quando você faz isso, acaba ampliando o 'pass through' [repasse da desvalorização para os preços]. Se, como agente econômico, sei que o câmbio é R$ 2,00 ou mais do que R$ 2,00, não coloco nenhum risco de que ele possa ficar abaixo disso e já defino o valor de todas as minhas compras, vendas e orçamento com base nisso. Então, o 'pass through' de câmbio flutuante, que é sempre menor que o de câmbio fixo, acaba ficando maior do que deveria.

Valor: O erro está na sinalização da taxa e não necessariamente na desvalorização?

Figueiredo: Claro. A desvalorização sem dúvida tem lá um 'pass through' e, portanto, um efeito sobre a inflação. Mas o 'pass through' acabou sendo maior por causa dessa comunicação.

Valor: A desvalorização era necessária?

Figueiredo: Não é uma questão de ser ou não necessária. Existe no mundo essa situação em que todos os países, de maneira direta ou indireta, estão desvalorizando suas moedas. Estão fazendo isso por falta de crescimento. Todos querem desvalorizar um pouco. Quando isso ocorre ao mesmo tempo, é como se ninguém tivesse desvalorizado. Nesse sentido, não dá para criticar o governo pelo fato de querer um câmbio mais desvalorizado porque, do contrário, o Brasil seria o único país que não estaria preocupado com isso. Quando todos desvalorizam e você mantém o seu câmbio valorizado, o custo para você é muito maior. Por outro lado, o câmbio não é um instrumento para o BC não ter que subir juros. O que o BC está fazendo é trazer o câmbio para uma realidade a mais próxima possível do câmbio flutuante, em que o 'pass through' é menor. O câmbio um pouco abaixo de R$ 2,00 ajuda bastante nisso.

Valor: Por quê?

Figueiredo: Porque acaba com a ideia de que o câmbio vai para R$ 2,10, R$ 2,20. A semana passada foi um passo enorme em direção a tudo isso que falamos.

Valor: O que o faz acreditar nisso?

Figueiredo: O BC veio a público e falou, com todas as letras, que muito provavelmente vai subir a taxa de juros. Fora de um documento formal e de uma reunião do Copom [Comitê de Política Monetária], não sei o que mais ele poderia ter falado para dizer isso. Ele [Alexandre Tombini, presidente do BC] disse que está desconfortável com a inflação, e não é que esteja com medo de que a inflação suba. Ele está desconfortável com o patamar da inflação de hoje. As pressões estão se espalhando fortemente. O índice de difusão [do IPCA] está em 75%. E o BC está super comprometido em ter este ano inflação menor que a do ano passado. O mercado acreditava que o BC não elevaria os juros nem com a inflação beirando os 6% no fim de 2013. O BC colocou todos os ingredientes para sinalizar aumento de juros. O único reparo que ele fez foi dizer que o processo é mais sereno.

"Não me parece que seja o caso de usar medidas macroprudenciais. Neste momento, o BC precisa usar instrumentos clássicos"

Valor: De onde pode se tirar essa mensagem?

Figueiredo: Quando ele disse que ainda vale o que está dito na última ata do Copom.

Valor: Mas a ata diz que o juro ficará estável por "período suficientemente prolongado".

Figueiredo: Quando ele diz que isso continua é porque existe todo um ritual a seguir. Provavelmente, o BC não subirá o juro na próxima reunião [nos dias 5 e 6 de março], mas, confirmando toda essa preocupação com a inflação, ele deve tirar dos próximos documentos a referência a 'suficientemente prolongado' e ficar livre para a reunião seguinte. Esse BC às vezes surpreendeu o mercado, mas sempre teve preocupação com a questão do ritual e da comunicação.

Valor: O senhor acha que eles começam a endurecer a linguagem na próxima reunião?

Figueiredo: Não, eles já endureceram. O que foi feito, para mim, já é uma medida de política monetária. Não dá para esperar para subir os juros em julho ou agosto. Há outra questão muito importante.

Valor: Qual?

Figueiredo: Hoje, as expectativas de inflação estão em 5,7% para este ano. Estão num nível crítico porque não podem ir para 6%. Se forem, o custo de trazer de volta e o tempo para fazer isso são muito mais altos. Minha impressão é que o BC quer derrubar a inflação deste ano bem abaixo dos 5,84% do ano passado. Não pode ser 5,7% porque, nesse caso, seria uma questão só de semântica. O número que eles perseguem é aquele que as pessoas reconhecerão como bem mais baixo que o de 2012. No mercado, a ficha ainda não caiu. Vejo ainda bastante ceticismo em relação ao que o BC vai fazer. Alguns acham que ele poderia usar o câmbio, outros acham que eles podem usar medidas de oferta, como a desoneração da cesta básica. No caso do câmbio, a intervenção de sexta-feira foi muito clara.

Valor: Em que sentido?

Figueiredo: O BC deixou claro que não vai usar o câmbio para segurar a inflação. O câmbio tinha caído por causa de uma declaração do ministro da Fazenda [Guido Mantega] e o BC foi lá e fez uma intervenção trazendo a taxa um pouco mais para cima. Ficou claro que o câmbio não é para isso. É possível até que o câmbio venha para R$ 1,95, mas não será usado para não ter que aumentar juros. Como o crédito não está crescendo como crescia lá atrás, não me parece que seja o caso de usar medidas macroprudenciais. Neste momento, o BC precisa usar instrumentos clássicos. Para mim, o mais provável é que em abril tenhamos o primeiro aumento de juros.

Valor: Qual seria o aperto necessário?

Figueiredo: Se fizer agora, o orçamento do aumento será bem menor. Quanto mais o BC demorar, mais trabalho ele vai ter para trazer a inflação. O ideal é o BC não ter que fazer nada em 2014.

Valor: Por quê?

Figueiredo: Porque nenhum banco central gosta de fazer aperto monetário em ano eleitoral. O ideal é fazer o ajuste e já ver o seu impacto no fim deste ano, início do ano que vem, assim, 2014 fica um ano tranquilo. Se ele faz agora, ganha confiança, com mais investimento etc., o que pode inclusive suplantar o aperto que está sendo feito com o juro. Pode haver, de fato, algum esfriamento do lado do consumo e dos serviços, de forma gradual e reduzindo a pressão inflacionária, mas por outro lado não inibe o investimento, pelo contrário, acaba até gerando confiança.

Valor: Um aumento de juros agora não derrubaria ainda mais a economia?

Figueiredo: Não vai perder muito em termos de produto. O que vamos ter é um equilíbrio maior, que é o que a nossa economia está precisando. Não podemos ter serviços rodando a quase duas vezes a inflação.

Valor: O senhor acha que o BC está atrasado?

Figueiredo: Não. No meio do ano passado, a inflação estava próxima da meta de 4,5%, o mercado projetando 4,8%. De repente, vieram o choque das commodities e os efeitos da própria desvalorização do real. O BC tinha que esperar para ver se esses choques iam ou não se espalhar. Porque, se não se espalham, o BC nada tem a fazer. Mas se os choques se espalham, o BC tem muito a fazer.

Valor: O BC não estaria aumentando o tom para sinalizar ao próprio governo que, se não puder apreciar a taxa de câmbio, terá que elevar juros?

Figueiredo: Todo o mundo no governo está dizendo, inclusive a ministra Gleisi Hoffman (Casa Civil), que, se o BC precisar fazer [aumentar juros], ele vai fazer. O Mantega já disse isso. Se esquecêssemos a nossa percepção e olhássemos só o que já foi feito, entenderíamos melhor. Este governo começou o mandato subindo os juros. Não parece razoável achar que eles não subirão mais. Eles já disseram, inclusive, que os ciclos econômicos não foram abolidos. Não fere o discurso deles se o BC subir os juros, digamos, em até 100, 150 pontos básicos [1,5 ponto percentual].

Valor: O senhor tem uma estimativa do quanto será necessário subir?

Figueiredo: É muito difícil dizer. O que feriria muito o discurso do governo seria subir para 10%, 10,5%. Agora, para não subir nessa intensidade o BC não pode se atrasar. O mercado está tão cético que, se o BC fizer um movimento, terá forte impacto. A frase do Tombini já teve impacto.

Valor: O câmbio não seria variável mais apropriada agora uma vez que não derrubaria o crescimento?

Figueiredo: Tem um componente enorme no câmbio que é choque de oferta. Então, ele vai deixar de subir os juros por causa disso, enquanto a pressão inflacionária está se espalhando? Há momentos em que você tem que fazer um certo carinho na ortodoxia, não tem jeito. Não estamos falando só de pressão inflacionária, mas de uma percepção que é a pior possível. As pessoas não sabem muito bem o que o governo está fazendo e não estão conseguindo ler os sinais. Então, é preciso agir.

 

Fonte: Valor Econômico


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