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Os bastidores de uma aposta arriscada dos bancos centrais

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14/12/2012 - 11:39

A cada dois meses, mais de dez banqueiros centrais se encontram aqui no domingo à noite para conversar e jantar no 18o andar de um edifício cilíndrico com vista para o Reno.

À mesa estão os chefes dos maiores bancos centrais do mundo, representando países que produzem anualmente mais de US$ 51 trilhões de produto interno bruto, ou seja, três quartos da produção econômica mundial. Suas conversas têm se concentrado nos problemas econômicos globais e nas medidas dos BCs para gerir a economia.

Desde 2007, os BCs inundaram o sistema financeiro mundial com mais de US$ 11 trilhões. Diante de recuperações frágeis e dos problemas econômicos que fervem na Europa, o esforço se acelerou. Os maiores BCs planejam injetar mais bilhões de dólares na economia, investindo em títulos soberanos, hipotecas e empréstimos comerciais.

Essa estratégia é, na verdade, uma experiência de alto risco, baseada, em parte, nos trabalhos acadêmicos de alguns economistas que estudaram e lecionaram no Instituto de Tecnologia de Massachusetts, o MIT, nas décadas de 1970 e 1980.

Embora muitos governos, incluindo o dos Estados Unidos, ainda não tenham chegado a um acordo sobre a política fiscal - ou seja, a melhor forma de equilibrar as receitas fiscais com os gastos governamentais em épocas de pouco crescimento - os banqueiros centrais forjaram o seu próprio caminho, independente de eleitores e políticos, unidos por conversas frequentes e por relacionamentos que às vezes remontam à época da universidade.

Se os banqueiros centrais estiverem corretos, vão ajudar a economia mundial a evitar a estagnação prolongada e uma repetição dos erros cometidos pelos BCs nos anos 1930. Se estiverem errados, podem atiçar a inflação ou semear outra crise financeira.

"Será que a história vai concluir que eles fizeram muito pouco, ou demasiado? Não sabemos, pois ainda é um trabalho em andamento", diz Kenneth Rogoff, professor de economia na Universidade de Harvard e coautor de um livro, "This Time Is Different," ("Desta vez é diferente", sem tradução no Brasil), que examina as crises financeiras ao longo de oito séculos.

O Federal Reserve, banco central americano, anunciou na quarta-feira planos de continuar comprando bilhões de dólares em títulos do Tesouro americano a cada mês em 2013. O BC inglês, o Banco da Inglaterra, concordou em canalizar bilhões de libras para empresas e domicílios através dos bancos. O Banco Central Europeu se comprometeu a manter baixos os custos dos empréstimos de governos que buscaram sua ajuda. O Banco do Japão, sob pressão crescente para combater a deflação, está comprando 91 trilhões de ienes (US$ 1,14 trilhão) em títulos do governo, dívidas empresariais e ações.

O objetivo é reduzir o custo dos empréstimos e estimular os mercados acionários a incentivar investimentos por parte dos consumidores e das empresas. Mas o método nunca foi testado em uma escala tão global.

As reuniões entre os banqueiros centrais ajudam a avaliar os riscos. Um dia depois do jantar realizado aqui em junho, eles foram advertidos por um de seus anfitriões em um discurso:

"Os BCs têm se visto [...] forçados a ser os decisores políticos de último recurso. Eles estão fornecendo estímulo monetário em grande escala", disse Jaime Caruana, gerente-geral do Banco de Compensações Internacionais, onde se realizam os jantares. "Essas medidas de emergência podem ter efeitos indesejáveis se continuarem por muito tempo."

Outra crítica que tem sido feita: apoiar os mercados acionários e reduzir o custo do crédito são medidas que tornam mais fácil para os governos nacionais adiar decisões políticas difíceis para sanar problemas como o inchaço dos déficits orçamentários, segundo este ponto de vista.

Entre os críticos mais ferrenhos estão economistas do BIS, um organismo internacional sediado nesta cidade, que tem sido um local cada vez mais importante para conversas sobre o cenário financeiro pós-crise. Eles dizem que os BCs, em sua busca pelo crescimento mais rápido, estão ultrapassando suas possibilidades reais.

Os BCs controlam a torneira do fornecimento mundial de dinheiro. Quando aberta, o fluxo monetário aquece as economias, reduzindo juros e desemprego, mas correndo o risco de estimular a inflação. Fechar a torneira, por outro lado, aumenta o juro e esfria as economias, mas abaixa os preços.

Os banqueiros centrais prometeram que, uma vez que a economia global volte a se aprumar, eles vão fechar as torneiras em tempo de evitar a inflação. Mas retirar tanto dinheiro exatamente no momento certo pode se tornar um desafio político e logístico.

Os próprios banqueiros centrais estão entre as pessoas mais isoladas nos governos. Se mantiverem contatos demasiado próximos com os banqueiros privados, arriscam-se a desestabilizar os mercados ou dar aos operadores uma vantagem injusta. E para conservar sua independência, eles tentam manter os políticos a distância. Desde que a crise financeira eclodiu, no fim de 2007, eles têm procurado um ao outro em busca de conselhos. Juntos, ajudaram a conter a queda da economia mundial, reduzindo juros e injetando trilhões de dólares, euros, libras e ienes em bancos e mercados em dificuldades.

Três banqueiros centrais dos mais poderosos lançaram suas carreiras no MIT. O presidente do Fed, Ben Bernanke, e o presidente do BCE, Mario Draghi, doutoraram-se ali, no fim dos anos 1970. O presidente do Banco da Inglaterra, Mervyn King, lecionou ali nos anos 1980, dividindo sua sala com Bernanke.

Muitos economistas saíram do MIT acreditando que o governo pode ajudar a mitigar as crises econômicas. Segundo esse ponto de vista, os BCs desempenham um papel particularmente importante, não só por controlar os juros, mas também por influenciar as expectativas do público por meio de declarações.

Nos jantares de domingo em Basileia, que muitas vezes se prolongam por três horas, eles agora falam sobre os problemas prementes do mundo real. Os jantares fazem parte de dois dias de reuniões realizadas no BIS seis vezes por ano. Os convivas incluem os presidentes do Fed, BCE, Banco da Inglaterra e Banco do Japão, assim como dos BCs do Brasil, México, China, Índia e alguns outros países.

King, do Banco da Inglaterra, lidera as conversas no jantar. Os participantes têm seus lugares já designados em uma mesa redonda, em uma sala de jantar cercada por paredes brancas, teto preto e vistas panorâmicas. Os encontros não geram transcrições ou atas. Não se permite a presença de funcionários.

Enquanto os banqueiros centrais enfrentam dúvidas e divergências sobre como reanimar a economia global, eles formam uma confraria, unida por seus esforços para gerenciar o crescimento e se precaver contra a instabilidade financeira. Seus relacionamentos entram em ação em conversas telefônicas e pessoais.

"Um grande segredo da cooperação entre os bancos centrais", diz King, "é que você pode simplesmente pegar o telefone e entrar num acordo sobre alguma coisa muito rapidamente" durante uma crise.

 

Fonte: Valor Econômico


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