A combinação da alta da taxa básica de juros no Brasil com a nomeação da moderada Janet Yellen para comandar o Federal Reserve (Fed, o banco central dos EUA) se traduziu em maior disposição para ativos de risco. No Brasil, o dólar caiu 1,13% e encerrou cotado a R$ 2,1810, menor nível desde 18 de junho. O real foi a moeda de melhor desempenho entre as emergentes. No mercado futuro de juros, as taxas projetadas pelos contratos de Depósitos Interfinanceiros (DI) subiram, se ajustando à possibilidade de um ciclo de aperto monetário mais longo.
Com a elevação da Selic em 0,5 ponto percentual na quarta-feira, a 9,5% ao ano, aumentou o diferencial entre juros locais e externos. Nos EUA, por exemplo, a taxa está entre zero e 0,25% e, com a nomeação de Yellen para o Fed, a percepção é de que o desmonte do programa de compras mensais de US$ 85 bilhões em títulos leve mais tempo, retardando efetivamente um ciclo de alta de juros. Na zona do euro e no Reino Unido o juro básico está em 0,50%; em 2,50% na Austrália e na Nova Zelândia; em 1% no Canadá, e, perto de zero no Japão.
Contribuiu ainda para dar gás às moedas emergentes, a afirmação do presidente do Banco Central Europeu (BCE), Mario Draghi, de que prosseguirá com as políticas de estímulo, enquanto continua o impasse fiscal nos EUA e o timing para a reversão da política de estímulos. A possibilidade de um acordo sobre o teto da dívida americana, que contribuiu para a redução da aversão a risco ontem, não se concretizou. No fim do dia, o presidente Barack Obama rejeitou a proposta dos republicanos para estender por mais seis semanas o prazo para o limite do teto da dívida por não contemplar a reabertura das instituições públicas
Antes desse desfecho, o que se ouvia nas mesas de operações é que o real ganhou impulso graças ao ingresso de capital externo para a renda fixa. A manutenção do programa de compra de títulos pelo BC americano significa liquidez elevada e juro baixo, tornando os investimentos em ativos emergentes (financeiros ou não) extremamente atraentes. A moeda também avançou com a expectativa de bancos e grandes investidores de que o BC não deve aliviar o ritmo atual de elevação da Selic.
Esse entendimento foi sustentado pelo comunicado do Copom, divulgado na quarta-feira, ao anunciar o aumento da Selic. A nota, reprisada na íntegra pela quarta vez seguida, foi lida como a senha para mais uma alta da taxa básica em 0,50 ponto, o que deve levar a Selic a 10% ao ano no encerramento de 2013, com o ciclo podendo se estender no início de 2014.
Ao repetir o comunicado dos encontros anteriores, o Copom "praticamente decretou" que manterá o ritmo do aperto monetário, quebrando a percepção do mercado de 'tabu político' em "relação ao nível de juro de dois dígitos", segundo o economista Octavio de Barros, diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos do Bradesco. "Mantemos o cenário de encerramento do ciclo em janeiro com o arremate de um último aumento de 0,25 ponto". Isso consolidaria um aumento total de 300 pontos básicos desde o início desse ciclo de aperto. Para ele, a taxa básica "muito possivelmente" será mantida em 10,25% até o fim de 2014
Para Paulo Corchaki, diretor responsável pela área de investimentos do UBS Wealth Management Brasil, o fato de o BC repetir a íntegra do statement das reuniões passadas deu margem para uma mudança nas expectativas de parte do mercado para o rumo da política monetária e, consequentemente, para a correção que se viu tanto dos juros futuros quanto no câmbio. "Esse comunicado sugeriu que o BC não terá constrangimento em subir o juro para a casa dos 10%. Mas a minha sensação é de que nada mudou e que, por isso, ele não irá muito além", afirma Corchaki.
Diante dessa percepção, ele considera haver uma interessante oportunidade de aplicação especialmente nos contratos com vencimento a partir de janeiro de 2015. Ele calcula "um prêmio importante" no DI com vencimento em janeiro de 2016 e observa que o atual nível de juro real, ligeiramente acima de 5%, torna posições em NTN-B com vencimento em 2020 atrativas.
Segundo Marcelo Salomon, economista do Barclays para a América Latina, o BC deixou a porta aberta para manter o ritmo de aperto se considerar adequado, mas pode começar a discutir o "trade off", entre PIB e inflação. Ele espera mais um aumento de 0,25 ponto da Selic na reunião de novembro, que deve encerrar o ano em 9,75%. Para o economista, a depreciação do dólar é de curto prazo, e a tendência segue de desvalorização do real dado o cenário de redução dos estímulos pelo Fed no ano que vem.
O economista-chefe da Mauá Sekular, Alessandro del Drago, manteve a estimativa de que o juro subirá apenas mais 0,25 ponto em novembro, encerrando assim o ciclo de aperto monetário. Tal percepção baseia-se na percepção de que haverá, de fato, algum alívio da inflação em 2014. Sua projeção é de que o IPCA suba 5,8% em 2013 e 5,6% em 2014. Parte desse alívio vem da ideia de que a atividade vai se enfraquecer. Ele cita o fato de as condições financeiras estarem mais apertadas e também o nível baixo dos índices de confiança dos empresários como fatores que devem afetar o crescimento neste fim de ano. Além disso, o câmbio já teve alívio.
O economista-chefe do Itaú, Ilan Goldfajn, manteve, por ora, a aposta de que a Selic não atingirá dois dígitos, por conta do crescimento moderado e da desvalorização do real. A instituição espera alta de 0,25 ponto em novembro, com o ciclo se encerrando em 9,75%. Ele reconheceu, contudo, que a ausência de alterações na nota pós-Copom aumentou as chances de que o BC prossiga com altas seguidas de 0,50 ponto percentual, levando a Selic para mais de 10% ao ano. "Vamos esperar pela ata do encontro, para entender melhor os próximos passos do Copom."
Fonte: Valor