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BNDES: causa, consequência e avaliação

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19/12/2012 - 10:59

"O setor privado não gosta disso. Mas eu falo para eles: no dia em que vocês estiverem presentes, emprestando no longo prazo, eu reduzo o BNDES. Não quero aumentar o BNDES, mas sem ele não teríamos investimento no Brasil." Essas palavras foram ditas em julho por uma autoridade do primeiro escalão federal, quando questionada a respeito dos vultosos aportes do Tesouro ao Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).

Entre janeiro de 2009 e setembro de 2012, o BNDES recebeu em aportes do Tesouro R$ 250 bilhões. Chegam a R$ 276 bilhões em financiamentos quando acrescidos dos retornos obtidos. Esses recursos responderam por 51,4% dos R$ 538 bilhões desembolsados pelo banco no período. Mesmo admitindo-se que sejam integralmente pagos no futuro, a magnitude contrasta com os R$ 16,6 bilhões transferidos pelo programa Bolsa Família, em 2011, a 13,4 milhões de famílias.

Existem situações onde a concessão de subsídios ao investimento privado encontra amparo na boa teoria econômica. Isso ocorre quando os benefícios, do ponto de vista de toda a sociedade, resultantes do investimento privado - geração de empregos em áreas carentes, difusão de tecnologia em regiões atrasadas, etc. - ultrapassam aquilo que é considerado pelo empresário. No jargão econômico, diz-se que há "externalidades" geradas pelo investimento privado. Nesses casos, o Estado pode estimular com subsídios o empresário a elevar seu investimento, desde que o custo dos subsídios não supere os benefícios da externalidade.

Os empréstimos do banco de fomento são substitutos e não complementares ao financiamento privado

Outra situação em que se justifica o subsídio ao capital privado ocorre quando há entraves incontornáveis - escala mínima de produção, incerteza sobre direitos de propriedade, instabilidade do marco regulatório, etc. - que inviabilizam o investimento privado na ausência de um empurrão governamental. No jargão, diz-se que há "falhas de mercado".

A criação do BNDES em 1952, sob a liderança de um economista notadamente liberal como Roberto Campos, deveu-se ao reconhecimento de que externalidades e falhas de mercado justificavam a presença do Estado na intermediação financeira de longo prazo. Na ocasião, as quebras de contratos decorrentes das encampações de empresas estrangeiras no Estado Novo, a instabilidade macroeconômica que se refletia em frequentes crises cambiais e imprevisibilidade da inflação, a Lei da Usura, entre outras falhas de mercado, levavam o embrionário mercado financeiro nacional a atuar apenas em empréstimos de curto prazo. Para viabilizar investimentos de longo prazo, criou-se o banco de fomento.

Decorridos 60 anos, o país passou por grandes transformações. As crises macroeconômicas deram lugar a uma inédita estabilidade macroeconômica: inflação anual de um dígito, reservas cambiais superiores a um ano de importações, dívida pública líquida decrescente como fração do Produto Interno Bruto (PIB). O Tesouro Nacional emite títulos com 20 anos de maturidade, mesmo pagando taxa real de juros inferior a 4% ao ano, algo impensável há dez anos.

Diante da superação de muitas das falhas de mercado vigentes quando da criação do BNDES, dever-se-ia esperar que este banco perdesse importância relativa no conjunto do mercado de crédito nacional, restringindo sua atuação ao financiamento de investimentos geradores de grandes externalidades. Mas o que se vem observando, após a crise do subprime de 2008, é a ampliação do BNDES. Parte desta mudança decorre de uma visão política que, por exemplo, defende a criação de campeões nacionais por meio da aquisição de empresas internacionais por multinacionais brasileiras. Parte resulta da avaliação de que o BNDES é a única alternativa de crédito de longo prazo, e o aumento de seus desembolsos é necessário para alavancar o investimento no país.

Está na hora de se avaliar seriamente o retorno para o Brasil da atuação recente do BNDES e discutir com a sociedade seu melhor modelo. O corporativismo e a politização excessiva, ao considerarem a priori que tudo que o BNDES faz é bom para o país, não ajuda o banco. Por outro lado, excessos ideológicos onde o contrário sempre ocorreria - "é melhor fechar o banco" - é irrealismo político que não avança o debate. Artigo de Sérgio Lazzarini, do Insper, apresentado recentemente no congresso da Sociedade Brasileira de Econometria (SBE), identificou que os empréstimos do BNDES são substitutos e não complementares ao financiamento privado. O fato de a taxa de investimento não ter apresentado qualquer tendência de crescimento no período em que os empréstimos do BNDES explodiram constitui uma evidência nesta direção. Obviamente, para se avaliar com maior precisão o retorno para a sociedade decorrente da atuação do banco, necessita-se de mais estudos.

Após a grande queda da taxa real de juros brasileira, nunca antes na história deste país houve oportunidade tão propícia para se induzir o setor privado a entrar no financiamento ao investimento de longo prazo. No passado, com juros reais de 15% ao ano pagos pelos dos títulos públicos, não havia suficiente demanda por títulos privados de longo prazo - ações e debêntures. No presente, o que falta é adequada oferta desses títulos, pois as empresas, em vez de os emitirem, preferem se financiar no BNDES pagando Taxa de Juros de Longo Prazo (TJLP), enquanto o banco repassa os títulos federais emitidos pelo Tesouro para capitalizá-lo aos investidores institucionais que não conseguem encontrar títulos privados para comprar. Assim, torna-se difícil identificar o que é causa e o que é consequência: a atuação do BNDES decorre da insuficiência do mercado privado de crédito de longo prazo, ou este não se desenvolve devido à atuação do BNDES?

 

Fonte: Valor Econômico


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